
Enquanto o Brasil for desigual, seremos campeões em reciclagem
agosto 24, 2011Você já deve ter visto a campanha da Coca-Cola, que fala de otimismo e como, para cada pessimista, existem 84,5 pessoas de bem. É uma campanha gracinha, como diria a Hebe. O slogan, com o qual eu concordo – “Existem razões para acreditar. Os bons são maioria” – é toda a razão pela qual este blog existe. Mas uma frase captou minha atenção: enquanto a natureza ainda sofre, 98% das latas de alumínio são recicladas no Brasil.
A frase é verdadeira, não há como negar. Ano após ano, o Brasil é campeão de reciclagem de alumínio, superando países como o Japão. E o Brasil consegue esse feito, vejam só, sem políticas públicas fortes de reciclagem e logística reversa. Como é possível?
Porque é tudo uma falácia. É uma mentira disfarçada de duas verdades. E é bem fácil de fazer isso, basta correlacionar fatos que não têm ligação de causalidade. Por exemplo, você sabia que a redução no número de piratas é responsável pelas Mudanças Climáticas?
A Coca-Cola mostra a reciclagem brasileira como se fosse consequência de uma população otimista e educada, feliz e contente em colaborar. A impressão que fica, se não tivermos outras informações sobre o assunto, é que os brasileiros bebem refrigerantes e cervejas já pensando em jogar na caixa de coleta seletiva. E que o governo e as empresas disponibilizam caminhões para coletar esse material todo e levar para a reciclagem. Mas olha só: eu moro em São Paulo, a maior cidade da América do Sul, num bairro da região central, com dezenas de bares, estabelecimentos comerciais e residências de classe média e, adivinhe, não há coleta seletiva. Tenho que pegar todos os recicláveis que separo e levar até um mercado próximo, que faz esse serviço em troca da construção de uma imagem sustentável – embora, convenhamos, é responsabilidade deles, se pensarmos pela ótica da logística reversa.
Ou seja, a reciclagem, no Brasil, mesmo em grandes centros urbanos, quiçá em suas partes mais longínquas e inabitadas, é bastante difícil. Então como alcançamos esse status, esse troféu de maior reciclador de alumínio do mundo? Simples: temos a miséria. Temos um país extremamente desigual. Temos pobreza e pessoas que chafurdam no lixo alheio para retirar o pão. No Brasil, a reciclagem é possível graças, em grande parte, a cooperativas de reciclagem e catadores de lixo. Assim como aqui temos quem se disponha a limpar o banheiro dos outros, temos quem navegue as ruas em busca de latas de alumínio. Ouro de tolo.
E o irônico é que ela vai diretamente contra o que a campanha prega: otimismo. Então eu proponho que a Coca-Cola assuma uma postura mais honesta e diga a verdade:
Enquanto a população sofre, 98% das latas de alumínio são recicladas no Brasil.
EDITADO: A Eliane Koseki deu a dica do vídeo abaixo, uma paródia com o vídeo oficial da Coca.
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Em tempo: se a Coca-Cola prega a reciclagem e uma postura mais sustentável, ela esquece foi uma das grandes responsáveis pelo fim de uma das formas mais sustentáveis de se comercializar produtos: as embalagens retornáveis. Antes, vendiam o refrigerante. Hoje, vendem embalagens.
Mais em:
O problema com a Reciclagem – Parte 1
Você não sabe de nada da campanha, se informe primeiro pra depois falar. veja o documentário do victor muniz ” Lixo Extraordinário” .O que você fala é verdade ate um certo ponto Porque a coca cola esta ajudando. O cara do comercial Tião Santos, sou uma grande fã dele ele é presidente da associação dos catadores de lixo de Gramacho. Assista o documentário e veja o trabalho dele.
O link do documentário:
Michelle, se você não percebeu, verá q eu fiz o link para o Lixo Extraordinário. Eu vi a campanha e me informei, por isso escrevi o post. Será que você entendeu o que eu disse? Se você discorda, por favor, apresente argumentos.
o que tem a ver com o consumo da droga reciclada por excelência: o crack.
A larga maioria dos usuários são catadores de latinha…
Lucas, ainda que possa haver relação entre o consumo de crack e catadores, não acho que essa generalização seja prudente.
O assunto é muito delicado, mas a Michelle foi rude demais no caso.
O documentário Lixo Extraordinário é realmente tocante.
Parabéns! Um dos melhores posts que já vi!
O pior de tudo é que a “gracinha” do Governo leva a vantagem enchendo a boca para se vangloriar dessas notícias, mas camuflam o verdadeiro motivo pelo qual estamos com este “rótulo” falso. Como você bem disse, estamos assim graças a catadores de lixos e cooperativas que nunca tiveram uma ajuda governamental ou se tiveram provavelmente ficaram só na ilusão. Realmente revoltante.
Não interessa o que é reciclado, para o catador é só o seu ganha pão, pode ser bonito para quem vê mas é triste saber que muitas pessoas só vão ter um alimento no fim do dia, se limparem a sujeira que as empresas jogam nas ruas todos os dias…por que o consumidor não inventou a latinha, o isopor, o plástico…
É bonito falar de lixo quando se está longe dele…valeu coca-cola!
[…] no dinheiro assistencial que toda uma classe é capaz de lhe oferecer. ::: Confira também o post: Enquanto o Brasil for desigual, seremos campeões em reciclagem As vozes de Wall Street We are the 99% Compartilhe:EmailMaisDiggPrintLike this:LikeBe the first […]
Olá! Aqui na Alemanha a gente paga ‘casco’ de embalagens reciclaveis, só para nos obrigarmos a levar pro supermercado de volta. O valor é 0,25 euro a latinha ou a garrafa PET. (para termos de comparação o litro do leite custa 0,5 euro). Nos lugares movimentados, se vê catadores procurando embalagens que foram deixadas porpessoas que estavam passeando e não quiseram levar pra casa. Então, acho que não é o fim da embalagem retornavel o problema, e sim a falta de oganização do ‘retornamento’. Quem se interessar procura no google por Pfand na Alemanha que deve encontrar boas explicações.